Menos julgamento, mais diálogo

Nosso ambiente de trabalho está cada vez mais desafiador. São diversos assuntos surgindo todos os dias para nos tirar da zona de conforto ou do lugar que nos é familiar. Mas sempre pedimos desafios em nossas carreiras, então, acredito que esse seja um ótimo problema.

Um dos temas que têm mexido bastante com empresas e pessoas nos últimos tempos é a questão da diversidade. No início, a discussão girava principalmente em torno dos negros e das mulheres. Se voltarmos os olhos para um passado não muito longínquo, encontramos in- formações como, por exemplo, que nos anos 1970, algumas empresas sequer tinham banheiro feminino. Partindo dessa simples, e hoje absurda, constatação, não dá para negar que evoluímos um pouco. Ao mesmo tempo, outras “minorias” engrossaram as frentes de inclusão: pessoas com diferentes tipos de deficiência, orientações sexuais, religiões. Mais recentemente, o debate foi ampliado para os imigrantes e refugiados…

É muito longa a distância a ser vencida até chegarmos a ambientes verdadeiramente inclusivos e sem preconceitos. Sim, somos preconceituosos. O preconceito é um juízo pré-concebido que se manifesta por diferentes formas e, muitas vezes, sequer percebemos agir de tal maneira; afinal, o que não se assemelha a mim é estranho. O que assusta ainda mais é que, não raramente, virar as costas àquilo que nos é estranho não é suficiente. É quando o preconceito se manifesta através de atitudes de raiva e hostilidade.

Em um famoso discurso da história, Martin Luther King disse que sonhava que seus quatro filhos pequenos pudessem um dia viver “em uma nação na qual eles não sejam julgados pela cor da sua pele, mas pelo conteúdo do seu caráter”. Era agosto de 1963, e ainda hoje lutamos para que assim seja.

É uma questão cultural e precisamos falar sobre preconceito, devemos nos questionar para entender por que temos determinadas reações e aprender a nos livrar delas. Não precisamos aceitar tudo, mas podemos respeitar os outros.

Infelizmente, muitos não pensam assim. Participo de algumas discussões, grupos e empresas em que já ouvi dizer que é modismo falar sobre temas da diversidade, como empoderamento feminino, LGBTI+, 50+, raça, cor, religião e tantas outras variáveis. Confesso que isso me choca, e muito.

Só quem já sentiu na pele o preconceito sabe o que é ter que provar o tempo inteiro suas competências, explicar seus desejos e o que te faz (ou faria) feliz em um ambiente de trabalho e na sociedade, ser analisado pela aparência, condição ou gênero.

Mais grave do que isso são os números da violência gerada pelo preconceito: é sabido, por exemplo, que a expectativa de vida de travestis e de mulheres trans é de 35 anos, enquanto a média dos brasileiros é de 75,5 anos. Esse assunto é foco de estudos do psicólogo Pedro Sammarco, autor do livro Travestis envelhecem?, e do Grupo Gay Bahia. Pelo visto, infelizmente, a maioria não tem o direito de envelhecer.

Dados como esse deveriam sensibilizar profundamente todos, afinal, são pessoas julgando pessoas; são seres humanos hostilizando seres humanos. Por isso, muitos do grupo LGBT ainda preferem ter uma vida imaginária e criam personagens organizacionais. Recentemente, depois de uma de minhas palestras, uma pessoa me procurou e comentou que mantinha em sua mesa do escritório a foto de uma mulher e uma criança que nem sabia quem eram, mas fazia isso para se manter e se sentir incluído. Ele talvez não saiba, mas faz parte de um grupo expressivo, mostrado em um estudo de 2016, feito pela Center for Talent Innovation. De acordo com o levantamento, 61% dos funcionários LGBTs no Brasil escondem sua sexualidade dos colegas e gestores.

Ricardo Mota atua há 20 anos em RH. Atualmente, é executivo da Saad Company, representante da empresa britânica YSC no Brasil

Fatos e números como esses são um claro alerta da necessidade premente de incluir a diversidade na pauta das empresas para que, de fato, a gente consiga enxergá-la, senti-la e compartilhá-la. Que sejam feitas perguntas, pesquisas, conversas sobre inclusão. E, o que é mais importante, que se conviva com o diverso.

É claro que muitas organizações estão incomodadas com essa dura realidade e se mobilizam com o intuito de contribuir para uma mu- dança de cenário. E, o que é muito bom, percebo que cada passo, cada movimento dessas organizações a favor da Diversidade & Inclusão ganha repercussão e apoio em diversos grupos.

Quanto mais falarmos sobre D&I em nossas empresas, mais esse movimento atravessará os muros corporativos e adentrará nossas casas, envolverá nossas famílias e a sociedade. É nesse efeito multiplicador que está a grande oportunidade de transformar preconceito e exclusão em inclusão consciente.

Nossa causa não é a cor, o gênero, raça, idade, religião. É a construção de um mundo em que todos possam ser autênticos e contribuir genuinamente nas organizações. Um mundo em que exista a liberdade de ter uma opinião, uma ideia ou um pré-conceito sobre algo, mas também o respeito ao pluralismo.


fonte: Revista Gestão RH – Edição 145 . 2019

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